Bum Bum Tam Tam, Bach e Oswald de Andrade
"Tupi, or not tupi that is the question."
Johan Sebastian Bach foi um compositor, alemão, protestante que nasceu em 1685 (é o que diz o Wikipedia, ao menos). É um dos compositores mais importantes da música erudita atual e é também um ícone da música tonal com um livro de composições chamado "O Cravo bem temperado". Bach é um ícone tão importante para a música erudita que é impossível estudar música atualmente sem passar por ele.
Mas acredito que na atualidade uma grande que Bach fez a cultura brasileira se deu através de uma música para flauta conhecida como "Partita em Lá menor". Sim, essa música tão calma, tão barroca, foi uma das inspirações para uma das obras primas mais escutadas no Youtube, nas ruas, nas casas de intelectuais e até em produtoras britânicas chamada: BUM BUM TAM TAM do MC Fioti. (Juro que não estou sendo irônica).
Você pode escutar a composição dele completa sendo perfeitamente executada no vídeo abaixo.
Bum Bum Tam Tam, a música que viralizou nas ruas brasileiras a fora, que ganhou um produtor britânico e que tem "A flauta envolvente que mexe com a mente, de quem tá presente..." foi produzida assim, em casa, pelo Mc Fioti na Zona Leste de São Paulo - por gente como a gente, sabe. Muita gente já falou sobre a genialidade da ação, muitos comentaram sobre ser uma audácia, e eu queria dizer, também, que achei genial.
E foi depois de fazer essa relação, entre uma composição e outra que eu senti que me veio a grande chance de falar sobre um assunto que vinha querendo falar a tempos.
PARA TUDO QUE CHEGOU O MEU MOMENTO!!!!
No dia 1 de Maio de 1928, Oswald de Andrade escreve uma provocação na primeira edição
da "Revista de Antropofagia", era o famoso e tão debatido nas escolas de arte: MANIFESTO
ANTROPÓFAGO. Esse momento tão importante para definir o que seria produzido na área
ANTROPÓFAGO. Esse momento tão importante para definir o que seria produzido na área
das artes no Brasil, especialmente diante da classe intelectual, se deu devido a tentativa de
identificação do que significaria "Ser brasileiro" - assunto que estava em alta na época - e
de todas as revindicações já existentes do movimento modernista brasileiro (sim, aquele
mesmo da semana de 22 e do famoso quadro Abaporu da Tarsila do Amaral). É com esse
manifesto que Oswald define ser brasileiro como ser antropofágico.
Mas o que é ser antropófago??
Se você for pesquisar no dicionário, ou no google, a primeira coisa que aparecerá é que ser
antropófogo é o adjetivo para "aquele que se alimenta de carne humana".
Imagino que nem eu e nem você tenha esse hábito. Mas ele era comum no Brasil pré colonial entre os Tupis que se alimentavam dos guerreiros mais corajosos capturados em batalhas com o fim de adquirir as qualidades do seu inimigos. Oswald, então, analisando a cultura brasileira que já é cheia de misturas e acabo por definir que nós, simbolicamente, nos alimentamos dos nossos adversários (e ele define os adversários como a cultura imposta pelos colonizadores - e que depois seria através da cultura de massa da industria americana) para absorver suas qualidades e produzir algo novo, possibilitando, assim, a nossa "revolução do matriarcado de Pindorama".
Segue aqui o link do Manifesto: Manifesto Antropófago
Vamos ao ponto de ligação:
A música erudita, popularmente conhecida como música clássica, é denominada como "Cultura" ou "Alta Cultura" em um consenso geral - mesmo entre as pessoas que não escutam, não vão a concertos e não se interessam por esse tipo de música.
Ser uma pessoa "Culta" é ser uma pessoa que escuta música erudita, que vai à Óperas e a teatros, que lê livros - principalmente os consagrados - e que consome todo um acervo cultural que veio, na verdade, da Europa. (Lembra do Oswald falando de comer a cultura do colonizador??).
A cultura do funk carioca, por outro lado, é um dos clássicos exemplos do que chamam de "Baixa Cultura". Quantas vezes não tive que responder a afirmações como "Funk não é cultura!". Esse é um hábito muito comum, aliás, desde o inicio da nossa colonização que não se deu somente através da violência física, da dominação religiosa mas também da marginalização cultural que transforma a cultura do colonizador como única e possível, avançada e de "bom gosto" e a cultura do colonizado se transforma em qualquer outra coisa, menos em cultura.
(E pra quem, mesmo que inocentemente, ainda faz esse tipo de discurso vale lembrar que o Samba já foi proibido, você poderia ser preso se portasse um violão na rua e que até a gente chegar onde estamos foi um caminho bem complicado e nosso querido Samba, também, não era considerado cultura no início do século XX.)
Poucas vezes na minha vida - e quando eu digo poucas eu quero dizer quase nunca - eu vi uma forma tão antropofágica de se fazer música como no funk carioca (que foi uma ressignificação do funk americano altamente difundido entre as décadas de 60,70 e 80). Não são raras a utilização de um hit famoso para usar de base ao funk que será tocado nos bailes e nas ruas durante o carnaval. Até os nomes dos MC's podem conter ícones da industria musical como o famoso caso da Mc Beyoncé - que hoje é conhecida como Ludmilla.
A questão em Bum Bum Tam Tam não é que MC Fioti usou usou como base as populares músicas da Industria Musical. Ele foi fundo, lá na maior ferida que a cultura periférica sofre - unir o que as pessoas definem como "alta cultura" em um estilo que, por muita gente, nem sequer ganha o status de cultura.
ELE USOU BACH!!! QUE ENFRENTAMENTO!!!
Se foi intencional ou não, eu não sei, mas achei muito simbólico esse processo. MC Fioti não só se alimentou da cultura do colonizador - ou melhor dizendo, da maior figura da música erudita que temos até hoje - ele mastigou, engoliu e ainda fez todo mundo bater o bum bum no chão.
E sinceramente, com o sucesso de Anitta (lê-se Anira) mundo afora - aliás, vai malandra tocando em vários computadores internacionais - depois dessa genialidade de MC Fiotti, acho que Oswald estava certo: A revolução à brasileira será cultural e será Antropófaga.
Vamos ao ponto de ligação:
A música erudita, popularmente conhecida como música clássica, é denominada como "Cultura" ou "Alta Cultura" em um consenso geral - mesmo entre as pessoas que não escutam, não vão a concertos e não se interessam por esse tipo de música.
Ser uma pessoa "Culta" é ser uma pessoa que escuta música erudita, que vai à Óperas e a teatros, que lê livros - principalmente os consagrados - e que consome todo um acervo cultural que veio, na verdade, da Europa. (Lembra do Oswald falando de comer a cultura do colonizador??).
A cultura do funk carioca, por outro lado, é um dos clássicos exemplos do que chamam de "Baixa Cultura". Quantas vezes não tive que responder a afirmações como "Funk não é cultura!". Esse é um hábito muito comum, aliás, desde o inicio da nossa colonização que não se deu somente através da violência física, da dominação religiosa mas também da marginalização cultural que transforma a cultura do colonizador como única e possível, avançada e de "bom gosto" e a cultura do colonizado se transforma em qualquer outra coisa, menos em cultura.
(E pra quem, mesmo que inocentemente, ainda faz esse tipo de discurso vale lembrar que o Samba já foi proibido, você poderia ser preso se portasse um violão na rua e que até a gente chegar onde estamos foi um caminho bem complicado e nosso querido Samba, também, não era considerado cultura no início do século XX.)
Poucas vezes na minha vida - e quando eu digo poucas eu quero dizer quase nunca - eu vi uma forma tão antropofágica de se fazer música como no funk carioca (que foi uma ressignificação do funk americano altamente difundido entre as décadas de 60,70 e 80). Não são raras a utilização de um hit famoso para usar de base ao funk que será tocado nos bailes e nas ruas durante o carnaval. Até os nomes dos MC's podem conter ícones da industria musical como o famoso caso da Mc Beyoncé - que hoje é conhecida como Ludmilla.
A questão em Bum Bum Tam Tam não é que MC Fioti usou usou como base as populares músicas da Industria Musical. Ele foi fundo, lá na maior ferida que a cultura periférica sofre - unir o que as pessoas definem como "alta cultura" em um estilo que, por muita gente, nem sequer ganha o status de cultura.
ELE USOU BACH!!! QUE ENFRENTAMENTO!!!
Se foi intencional ou não, eu não sei, mas achei muito simbólico esse processo. MC Fioti não só se alimentou da cultura do colonizador - ou melhor dizendo, da maior figura da música erudita que temos até hoje - ele mastigou, engoliu e ainda fez todo mundo bater o bum bum no chão.
E sinceramente, com o sucesso de Anitta (lê-se Anira) mundo afora - aliás, vai malandra tocando em vários computadores internacionais - depois dessa genialidade de MC Fiotti, acho que Oswald estava certo: A revolução à brasileira será cultural e será Antropófaga.
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